terça-feira, 8 de dezembro de 2015
Leia na íntegra a carta enviada por Temer a Dilma
Segue a íntegra da carta enviada hoje pelo vice-presidente Michel Temer à presidente Dilma Rousseff.
Senhora Presidente,
"Verba volant, scripta manent".
Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso noticiário destes
últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no
Palácio. Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter
feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a
necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes cinco
anos. Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da Constituição
Federal. Sei quais são as funções do vice. À minha natural discrição
conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.
Entretanto, sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do
seu entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o
que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu governo.
Basta ressaltar que, na última convenção, apenas 59,9% votaram pela
aliança. E só o fizeram, ouso registrar, porque era eu o candidato à
reeleição a vice.
Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo, usando o prestígio
político que tenho advindo da credibilidade e do respeito que granjeei
no partido.
Isso tudo não gerou confiança em mim. Gera desconfiança e menosprezo do governo.
Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.
1. Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A
senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que tivera no
passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para
resolver as votações do PMDB e as crises políticas.
2. Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações
econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários,
subsidiários.
3. A senhora, no segundo mandato, à última hora, não renovou o
Ministério da Aviação Civil, onde o Moreira Franco fez belíssimo
trabalho, elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma
indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar
este fato no dia seguinte, ao telefone.
4. No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Ministério em
razão de muitas "desfeitas", culminando com o que o governo fez a ele,
ministro, retirando, sem nenhum aviso prévio, nome com perfil técnico
que ele, ministro da área, indicara para a ANAC. Alardeou-se a) que fora
retaliação a mim; b) e que ele saiu porque faz parte de uma suposta
"conspiração".
5. Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordenação
política, no momento em que o governo estava muito desprestigiado,
atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema difícil
porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários. Não
titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste, nada mais
do que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no
Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de
líderes e bancadas ao longo do tempo, solicitando apoio com a nossa
credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação.
6. De qualquer forma, sou presidente do PMDB e a senhora resolveu
ignorar-me, chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um acordo sem
nenhuma comunicação ao seu vice e presidente do partido. Os dois
ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a
menor preocupação em eliminar do governo o deputado Edinho Araújo,
deputado de São Paulo e a mim ligado.
7. Democrata que sou, converso, sim, senhora presidente, com a oposição.
Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento. Aliás, a primeira
medida provisória do ajuste foi aprovada graças aos 8 (oito) votos do
DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi aprovado por apenas
22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do nosso
sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que
deveríamos reunificar o pais. O Palácio resolveu difundir e criticar.
8. Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas
horas com o vice-presidente Joe Biden - com quem construí boa amizade -
sem convidar-me, o que gerou em seus assessores a pergunta: o que é que
houve que numa reunião com o vice-presidente dos Estados Unidos, o do
Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da "espionagem"
americana, quando as conversas começaram a ser retomadas, a senhora
mandava o Ministro da Justiça para conversar com o vice-presidente dos
Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança.
9. Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do
país) foi divulgada e de maneira inverídica, sem nenhuma conexão com o
teor da conversa.
10. Até o programa "Uma Ponte para o Futuro", aplaudido pela sociedade,
cujas propostas poderiam ser utilizadas para recuperar a economia e
resgatar a confiança, foi tido como manobra desleal.
11. O PMDB tem ciência de que o governo busca promover a sua divisão, o
que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que, como
presidente do PMDB, devo manter cauteloso silêncio com o objetivo de
procurar o que sempre fiz: a unidade partidária.
Passados estes momentos críticos, tenho certeza de que o país terá
tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais.
Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã.
Lamento, mas esta é a minha convicção.
Respeitosamente,
À Sua Excelência a Senhora
Doutora DILMA ROUSSEFF
Presidente da República do Brasil
Palácio do Planalto
Brasília, D.F.
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